
sucesso.
Mambo e sua dona são voluntários do Instituto Nacional de Ações e Terapias Assistidas por Animais (Inataa).
A ONG paulista, fundada em 2008, leva cães para visitar asilos e
hospitais infantis por toda a cidade. São quatro asilos e dois hospitais
que recebem visitas regulares dos cachorros. O time habitual, montado
para cada visita, é composto por três cães de médio porte, como Mambo,
dois cachorros menores e seus tutores humanos - que podem ser os donos
do animal ou algum voluntário da ONG. No Inataa, trabalham pouco mais de
40 cães.
A ideia do Inataa, e de outras organizações que fazem trabalho parecido, é de que o contato com os animais ameniza
as tensões do meio hospitalar, e ajuda o paciente a se sentir melhor.
“Passar 20 minutos na presença desses animais já melhora os seus
batimentos cardíacos, a sua pressão sanguínea”, diz Vera Abruzzini,
presidente do Inataa. “Eles também trazem conforto para quem vive em
asilos e se sente só.”
As visitas ao Cruz Azul ocorrem nas tardes de quinta-feira, semana sim,
semana não. Começaram por iniciativa de Claudia Begueldo, assistente
social do hospital e responsável pelas iniciativas que tentam humanizar o
ambiente hospitalar. A decisão de Claudia foi influenciada por dois
fatores: primeiro, há evidências científicas de que a presença de
animais ajuda na recuperação de pacientes. Cláudia teve a ideia de
trazer cães terapeutas para o Cruz Azul depois de ver experiências
bem-sucedidas em outros hospitais. Inspirou-se na iniciativa do Hospital
São Paulo, instituição ligada a Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp). Lá, as intervenções com animais acontecem há 9 anos.
Em segundo lugar, ela mesma adora cachorros. Não é a única: “Os
funcionários daqui também ficam animados quando é dia de visita”, diz
ela. Quem andava pelo corredores do hospital, naquela quinta-feira,
percebia certa excitação. “Hoje é o dia dos cachorros? Já já eu subo
lá”, disse uma médica ao encontrar Cláudia no elevador. Ela respondeu
com um sorriso.
Tratamentos assistidos por animais, ou TAAs, são
antigos. Há sinais de que ocorram há séculos, de maneira quase informal.
Um dos registros mais antigos da técnica foi feito pela britânica Florence Nightingale,
considerada a mãe da enfermagem moderna. Em 1860, Nightingale observou
que aqueles pacientes que contavam com a companhia de pequenos animais
domésticos manifestavam sensível melhora de saúde. “O comentário dela
influenciou muitos médicos a aplicar as terapias assistidas por animais
aos seus próprios tratamentos” diz Aubrey Fine, psicólogo clínico e
professor da Universidade Politécnica da Califórnia. Fine se dedica à
área desde 1973. Seu interesse surgiu por acaso, ao trabalhar com
crianças hiperativas. Numa tarde, Fine levou Sasha – uma pequena
ratinha-do-deserto – para brincar com as crianças. Notou como elas
mudavam de comportamento: “Mesmo as crianças mais agitadas se
aquietavam, e esperavam a vez para pegar Sasha nas mãos”.
O campo ganhou fôlego científico – ainda que fraco – a partir de 1961. Naquele ano, o psicólogo Boris Levinson defendeu, em uma palestra que ficaria famosa, os méritos dos bichos terapeutas.
Seus comentários foram recebidos com entusiasmo por alguns, e com
deboche por outros. No Brasil, alguns dos trabalhos mais importantes
foram publicados pela psiquiatra Nise da Silveira durante a década de 1990. No livro Gatos, a emoção de lidar, ela relata suas experiências com o uso de gatos no tratamento de pacientes com esquizofrenia. Além de gatos e cachorros, há terapias desenvolvidas com uma infinidade de animais – de cavalos a cobras.
Ainda faltam evidências científicas quem amparem as TAAs. Fine diz que a
maioria dos trabalhos hoje publicados se resume a revisar os resultados
de pesquisas antigas, sem que novas experiências sejam realizadas. A
maioria defende que a presença dos animais interfere na regulação de
três tipos de substâncias importantes para o bem-estar dos humanos: endorfina, oxitocina e as catecolaminas.
As duas primeiras são hormônios associados às sensações de prazer. Elas
aumentam na presença dos animais. Jás as catecolaminas são hormônios
como a adrenalina, que contribuem para que a pessoa se sinta estressada.
Quando os animais estão por perto, seus níveis caem.
Os efeitos das visitas são sentidos também nos cãezinhos. Um estudo
desenvolvido por veterinários parceiros do Inataa constatou que a
frequência cardíaca dos animais salta quando em contato com as crianças.
Por isso, as visitas tendem a ser curtas – duram entre 40 minutos e 1
hora. É importante não deixar os cachorros estressados demais.
No Cruz Azul, as crianças usam os cães para perder o medo do
tratamento. Enfaixam os cahorros, fingem que vão fazer operações, trocam
órgãos de mentira entre os cães. Os cachorros recebem os afagos e
puxões docilmente. Essa é uma característica importante do cão
terapeuta: ele precisa ser receptivo ao toque.
Na teoria, qualquer cachorro pode virar terapeuta: “Um cão terapeuta
não precisa ter raça”, diz Vera. Mas carece de alguma vocação. Os
interessados passam por testes do Inaata, para assegurar que vão se
manter dóceis quando puxados, apertados ou afagados. E para saber como
reagem na presença de bengalas, cadeiras de rodas ou do cheiro do
hospital. O cachorro também precisa obedecer a alguns comandos básicos –
“deita”, “fica”, “senta”. uma vez aprovado nos testes, ele passa por um
período de estágio: começa a frequentar asilos por períodos curtos, em
seções de 10 ou 15 minutos. Visitas a crianças, só depois da graduação.
Durante aquela tarde, Mambo se comportou como um cão modelo.
Derreteu-se aos pés de Vitor, um menino de dois anos, internado há três
dias. O encanto era recíproco. “A gente não tem muito espaço em casa,
então ele não está acostumado com cachorros grades”, diz Manoel
Rodrigues, pai do menino. Carla Bononi, a dona de Mambo, estava
orgulhosa. “Não tem nada melhor do que a gente receber sorrisos”.
Fonte: Época
Patricia Lopes
Jornalista da Equipe de Comunicação da ONG Hospitalhaços
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