quinta-feira, novembro 28, 2013

Com vocês a palhaça Tulipinha!

Pensei muito antes de enviar a minha história... sou uma palhaça recente, que acabou de se formar e me questionei se tinha algo realmente relevante pra contar comparado a tantos palhaços mais experientes do que eu... pensei, pensei e acabei chegando à conclusão de que quando se trata de fazer a diferença na vida das pessoas não importa se o palhaço acabou de nascer ou já tem uma super bagagem, basta fazer o trabalho com todo seu coração e foi assim que aconteceram duas das situações que mais marcaram minha vida.

Em primeiro lugar, quero me apresentar: sou a palhaça Tulipinha. Ganhei esse nome de uma das pacientes que estava internada na maternidade, na minha época de visitas ainda. Nunca gostei de flor, mas por uma ironia do destino, estava à procura de um nome para minha futura palhaça, e a paciente – que era de Holambra – falou que Tulipa era um nome bonito. O meu supervisor, o Jabu, estava naquele quarto e me contou que já havia pensado nesse nome muito antes, mas no diminutivo: Tulipinha, por eu ser pequena. 

Não sei bem dizer o que aconteceu, eu que não queria um nome de flor, me vi profundamente naquele nome, e a partir daquele dia, meu coração dentro do hospital não era mais da Thais, era da Tulipinha. Conto essa história porque ela será importante para entender algo que explicarei posteriormente.

Minha palhaça já tinha nascido, e em uma das primeiras atuações que fiz uma situação me deu a certeza de que era ali que eu deveria estar. Estávamos no 7º andar do Hospital de Sumaré, e é neste andar que muitas vezes residem os casos mais graves. Havia naquele dia muitos quartos em contato, e em alguns dos quartos que poderíamos entrar, muitos pacientes estavam dormindo. Eu estava atuando com a palhaça Pirilim nesse dia, paramos na porta de um e vimos que dois pacientes estavam dormindo. Fizemos duas bexigas, uma pra cada, e enquanto ela entrava pra deixar ao lado da cama deles, fiquei na porta reparando que um dos senhores acordou nesse ato. Pirilim saiu, e eu continuei na porta. 

Nesse momento algo mágico aconteceu: mandei um beijo com as mãos e assoprei para o paciente que me olhava ainda sonolento, e o senhor, com o mais belo gesto, sorrindo, com certa dificuldade fez como se pegasse meu beijo no ar e o colocou em seu coração. Naquele momento, senti que eu fiz a diferença na vida daquela pessoa, vi que meu papel foi cumprido, afinal de contas, mesmo com tantas dificuldades ele quis retribuir meu gesto de carinho, mas acima de tudo, vi aquela pessoa, naquele tão simples gesto mudando o meu dia, a minha vida. Trabalhar como palhaça de hospital é isso, valorizar coisas que passariam despercebidas, como um olhar, um sorriso, um beijo, mas que mostram um “você fez meu dia ficar melhor”. 
Agora voltando na história do nome nunca parei muito para pensar sobre isso até que há uns dois dias atrás, após ter tirado uma foto com uma tulipa que eu havia feito de bexiga (que por sinal, fiz questão de aprender), resolvi pesquisar um pouco sobre a flor, para ver se me dava ideia sobre legendas para pôr na foto e eis que encontro o seguinte excerto em uma das inúmeras páginas que o google me trazia:
"Tulipa é uma flor que também marcou a história, na Idade média, as tulipas vermelhas eram o símbolo da loucura, e os próprios médicos utilizavam a flor como símbolo de que a pessoa tinha sido curada, estava sã."
A partir desse momento, senti uma responsabilidade profunda dentro de mim, senti que eu estava no lugar certo, fazendo a coisa certa, como se eu estivesse vindo ao mundo pra isso, pra fazer a diferença na vida das pessoas, assim como eu fiz na vida daquele senhor e ele fez na minha. Não sei porque Deus me colocou neste lugar, não sei porque por uma ironia do destino ganhei esse nome, mas com toda certeza, eu queria ser a loucura em pessoa, e levar em cada quarto que eu visitasse o anúncio da cura, ou pelo menos a esperança dela.
Hoje, eu entendo muitas coisas que aconteceram comigo. Recordo-me por exemplo de no ensino médio várias vezes cogitar fazer medicina, pela profissão admirável que é. O que me motivava era a minha vontade em poder ajudar as pessoas a saírem do estado enfermo, a cuidar de cada uma delas, ajudá-las a ficarem curadas. Mas lembro-me também do meu pavor de sangue, injeção e coisas afins, que me deixavam a quilômetros de distância da profissão de médico. 
Nunca entendi porque eu tinha tanta vontade de ser médica se o lado prático da profissão não tinha nada a ver comigo, se entrar no ambiente hospitalar com toda a tensão e muitas vezes tristeza me fazia mal. Hoje eu sei que no fundo, a Tulipinha sempre viveu dentro de mim, e o meu coração, que sempre foi guardião dela, escondia de mim que eu seria médica sim, mas não com os méritos da profissão em si, eu seria uma médica da alegria, onde a cura, ou o alívio de dores eu daria às pessoas não com medicamentos e prescrições, mas ao tirar o sorriso de cada uma, ao enviar um beijo que seria guardado no coração dela.
Sou muito grata à ONG por ter me dado a oportunidade de ser palhaça. Sou palhaça mesmo quando não estou caracterizada, porque ela reside o tempo todo em meu coração, e espero continuar sendo ainda por muitos anos, pois minhas energias são renovadas a cada olhar sincero que cruza com o meu no ambiente hospitalar.

Thais Alves - Palhaça Tulipinha




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